A GRANDE REPRESSÃO

Diário de Notícias, 20090305
Pedro Lomba
Jurista - pedro.lomba@eui.eu

Num artigo publicado há semanas no Financial Times, o historiador inglês Niall Fergusson descreveu este período que vivemos como a Grande Repressão. Leram bem: a Grande Repressão (falar-se aqui em Grande Depressão não seria novidade). Lembra Ferguson que a crise financeira pôs a nu a realidade das economias ocidentais nas últimas décadas: o endividamento excessivo dos estados, bancos e empresas. Essa cultura de endividamento fez parte do nosso modo de vida. Permitiu ganhos inéditos mas também trouxe excessos que estamos a começar a pagar. A repressão consiste em acreditar que essa dívida só pode ser debelada contraindo mais dívida. Ou seja, uma passadeira vermelha para em tempos de crise o Estado gastar até não poder mais.

Neste momento corre um debate na América sobre o que deve ser feito pelo Governo para estancar de uma vez a crise dos bancos. Os bancos americanos estão insolventes, incapacitados para o que se espera que um banco faça: pôr o dinheiro a circular na economia. Se os bancos estão insol- ventes, o que deve fazer o Estado? Nacionalizar ou não nacionalizar, eis a questão, perguntava o colunista Martin Wolff na edição de ontem também do Financial Times. Ben Bernanke, chefe da Reserva Federal, é contra. O próprio Wollf diz que tudo não passa de um problema semântico: o importante é que o Estado comece já a consertar o sistema financeiro. Ferguson sugere que os bancos em dificuldades sejam reestruturados mas não exactamente nacionalizados. O caminho não está em aumentar os instrumentos de dívida mas em reduzi-la. O Estado não tem de garantir as perdas dos accionistas. E, assim que os bancos forem recapitalizados, deve abandonar um palco para o qual não é competente.

Este é um debate a que devemos estar atentos por uma razão. Um problema desta crise é não percebermos - e não nos preocuparmos com isso - até onde deve ir o Estado para a travar. Enquanto isso acontece, vamos assistindo todos os dias ao aumento da dívida pública e ao sacrifício dos contribuintes. Dou um exemplo: desde que o Governo decidiu a nacionalização do BPN, um banco responsável pela sua própria crise, já saíram 1800 milhões de euros dos dinheiros públicos. Que tem feito o Estado ao BPN? Que mais irá fazer? Depois, acabaremos todos como aquele partido que não custa identificar, a defender que a solução para a subida do desemprego é o Estado criar postos de trabalho?

E o pior é que a Grande Repressão não reside apenas nesta ideia de que o Estado está autorizado ao intervencionismo económico e ponto final. Está também no princípio de que o Estado pode e deve resolver a crise sozinho, mesmo recorrendo ao proteccionismo contra as suas obrigações externas. É o que já está a acontecer na Europa e tem de ser evitado.

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