A ascensão do Senhor

Homilia da Ascensão do Senhor, Alverca, 20090524

Giovanni Musazzi

A festa que hoje celebramos é a festa do humano: na casa de Deus a Ascenção é a festa do humano porque Deus permite que através de Jesus, com Jesus, o homem entre pela primeira vez no domínio profundo no qual o Pai do Céu cria todas as coisas, instante a instante, conhecendo-as melhor do que uma mãe conhece o seu filho. Ascenção aos Céus significa que Cristo desceu à raiz de todas as coisas: à raiz de cada rosto, à raiz de cada flor, estrela, de cada coisa.

Precisamente por isso podemos chamá-la festa do milagre. O que é o milagre? O milagre é um acontecimento que pela sua própria natureza, pela sua própria força pode, imediatamente, chamar atenção para algo que está fora do meu horizonte, algo misterioso, algo que chama a atenção para o Mistério de Deus.

Reconhecer o milagre não é uma coisa de crianças: as crianças são naturalmente positivas, estão naturalmente dispostas a ver a positividade das coisas e, normalmente, não são capazes de perceber a diferenca própria do milagre. A sua compreensão é própria do homem adulto, do velho: a palavra milagre explica todos os caminhos da nossa vida, explica todas as estradas da nossa existência, a realidade como um universo de coisas. Que do nada emerja a minha pessoa, a tua pessoa, tudo o que há no mundo, porque nenhuma coisa se faz sozinha. A maravilha da criança diante do que sucede, no homem adulto torna-se reflexão: nada se faz, existe por si, mas apela a Deus.

Assim é o primeiro milagre: a minha existência: ser; ter a vida; que eu seja. Pensemos um momento nas nossas vidas: é um milagre poder viver, poder estar aqui, com o nosso carácter e as nossas pessoas, com as coisas que temos, com as nossas histórias. Não sei quantos de nós, tendo acordado esta manhã pensaram que podiam não estar vivos, que podiam não ter o que têm. Então é um milagre: um facto positivo, normalmente não merecido, que sucede nas nossas vidas.

Mas também é um milagre o facto de estar aqui: um povo que se reúne e que me obriga a estar mais atento, a ser mais coerente, que me ajuda a rezar melhor, me faz mais capaz de reparar no que sucede; um povo que ajuda a minha vida a ser mais vida.

Sim, tudo é milagre.

Esta palavra encontra o seu complemento quando se liga à palavra Jesus. Temos que imaginar os primeiros discípulos: Jesus agrupa-os, absorve-os um por um, como parte da sua própria humanidade. “Já não existe judeu ou grego, mas todos são um em Cristo”: é a força do Baptismo que nos cria de novo.

Todo o nosso estar juntos é para realizar isso. E, curiosamente, só disso nasce a moral; não se trata de realizar uma perfeição impossível; trata-se de uma devoção a Ele, à sua presença no mundo. Quando recebemos a comunhão, quando rezamos, quando vamos trabalhar, a nossa principal preocupação é ser, em primeiro lugar, fiéis a este milagre.

A vida é um milagre.

A festa da Ascenção ensina-nos a história desse Homem, Jesus, que se fez o nosso companheiro de caminho, irmão e redentor, que desceu até a profundidade última das coisas; através d’ Ele, aprendemos como Deus faz as coisas; entramos na paciência e ternura de Deus.

O milagre dos milagres é o mesmo Cristo: nesta missa pedimos-Lhe para nos abandonarmos a Ele, para o seguirmos fielmente, como uma criança segue a sua mãe, apesar dos seus erros, apesar das nossas traições. Que possamos voltar todas as manhãs com a mesma humildade e o mesmo desejo de O seguir.

Peçamos que a alegria que dá a Sua presença possa ser para todos.

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