ILUSÃO


DESTAK | 17 | 03 | 2010   18.32H
João César das Neves | naohaalmocosgratis@fcee.ucp.pt
Neste ambiente de crise e austeridade vive-se uma grande ilusão de óptica que é preciso acautelar: os que protestam não são as vítimas da situação.
Nos países europeus existe a antiga tradição de manifestações públicas, consideradas sinal de saudável vida democrática. Mas em Portugal, como na Europa, raramente se vêem manifestações de pobres e desempregados, empresários falidos e imigrantes, trabalhadores temporários e explorados.
Os que foram atingidos em cheio pela recessão estão silenciosos e resignados. Não se podem dar ao luxo de protestar. São outros grupos, bastante diferentes e protegidos, que vêm para a rua e jornais expressar a sua zanga sobre a forma como a evolução económica e opções políticas os têm tratado.
Os gritos que se ouvem são em defesa de direitos adquiridos, promessas não cumpridas, expectativas defraudadas. Não vêm dos que não têm direitos, não ouviram promessas, não sentem expectativas. Fala-se muito desses, mas apenas como figura de retórica, na argumentação em defesa dos privilégios dos outros.
Entretanto os que protestam têm emprego garantido, regalias seguras e estatuto estável. É verdade que foram atingidos pelas medidas de austeridade mas, mesmo depois delas, ainda estão muito melhor que a maioria da economia, que vive horas de angústia e incerteza sem gritar.
Até se pode dizer, suprema ironia, que em alguns casos foi por causa das reivindicações dos que gritam que nasceu o descalabro orçamental. Assim, em grande medida, são os manifestantes os responsáveis pela crise.

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