A autoridade é um princípio de ordem

Mafalda de Avelar   
Diário Económico 08/08/12 00:05

O autor explica porque a autoridade e as sociedades contemporâneas tem uma relação “ambígua”.
O ensaio, da autoria de Miguel Morgado, procura responder à questão "O que é a autoridade?". Em entrevista, ao Diário Económico, refere que "o início de qualquer definição minimamente coerente e conceptualmente interessante de autoridade tem de começar do seguinte modo: ‘A autoridade é um princípio de ordem...'. Poderá parecer que é um início que diz quase nada, mas o resto só pode vir a seguir a isto".
Como é que se define "autoridade"? 
A "autoridade" é daquelas noções que intuitivamente compreendemos, de um modo mais ou menos completo, no nosso quotidiano, mas que não se sujeitam docilmente a uma definição. Até porque apareceram outras noções que são muitas vezes confundidos com a autoridade, ou tidos como seus quase-sinónimos (por exemplo, "poder", "legitimidade", "jurisdição", "soberania", entre outros). No livro procurei discutir as proximidades e as distâncias dessas outras noções com a de autoridade para melhor compreender as fronteiras da sua extensão conceptual. Aliás, proponho ao leitor, logo no início do livro, que o melhor é começarmos por examinar a condição ou a teoria do colapso da autoridade, ou, melhor ainda, da negação da autoridade. E é preciso acrescentar que no nosso vocabulário, e em grande medida por culpa das ciências sociais, a palavra autoridade é frequentemente associada ao lado mais sinistro das relações humanas políticas: a opressão de uns por outros. Dito isto, parece-me que o início de qualquer definição minimamente coerente e conceptualmente interessante de autoridade tem de começar do seguinte modo: "A autoridade é um princípio de ordem..." Poderá parecer que é um início que diz quase nada, mas o resto só pode vir a seguir a isto.
Diz no livro que as sociedades contemporâneas têm uma relação algo ambígua com a autoridade. Porquê? 
As sociedades contemporâneas são formas de ordem. Mas de uma ordem que não radica num só princípio e ordem, e além disso, que assenta noutros princípios e valores que não são facilmente conciliáveis com a "autoridade". Daí a relação ambígua. Algumas das exigências da autoridade são dificilmente aceites por outros princípios e valores de que ninguém, com razão, quer abdicar. Contudo, ao mesmo tempo, também não queremos, ou não podemos, ou não sabemos, dispensar a autoridade como princípio de ordem, assim como lá no fundo, de tempos a tempos, recolhemos uma impressão forte de que os próprios valores e princípios que temos por sagrados sofreriam muito sem o apoio complementar ou cultivo da autoridade, sem a sua presença benigna.
Será possível conciliar as aspirações do homem democrático com a autoridade?
É desejável e é possível. No livro defendo que em democracia a noção de autoridade é sujeita a uma necessária adaptação. Aí já estamos a falar da conciliação possível e necessária entre a democracia e a autoridade. Feita essa adaptação aos princípios do consentimento, da liberdade, da igualdade, da individuação do julgamento, e por aí fora, é perfeitamente razoável sustentar que, na realidade, o regime democrático é a melhor casa para a autoridade. Poder-se-ia até dizer que as democracias mais maduras, mais duradouras e mais dinâmicas serão as que souberem albergar no seu seio, e nos lugares adequados, a autoridade, e simultaneamente, que consigam moldar a autoridade aos imperativos e movimentos das sociedades democráticas. Numa palavra, serão aquelas que melhor souberem operar essa conciliação.
Perfil: Miguel Morgado
Licenciado em Economia, tem Mestrado em Ciência Política e Relações Internacionais e tirou o seu Doutoramento em Ciência Política, pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, entidade onde é, actualmente, Professor. No mundo académico foi professor convidado da Universidade de Toronto. É autor de vários artigos e livros.

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