Homens cheios de si mesmos

José Luís Nunes Martins, i-online 22 Dez 2012
Somos todos pequenos e quase insignificantes. Aceitarmo-nos uns aos outros nessa condição é o primeiro passo para nos conhecermos e amarmos...
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O mundo começa a ser pequeno para tanta gente que se julga o centro do universo, são cada vez mais aqueles para quem o próximo não passa de um figurante sem qualquer importância numa ópera de que são os únicos protagonistas.
Têm sempre muitas coisas materiais mas nunca têm paz.
São incapazes de acolher a novidade, de se aperfeiçoar, entupidos de egoísmo até aos olhos, têm por valores supremos a razão e a liberdade.
Nem a razão nem a liberdade são males, entenda-se bem, mas quando surgem como pilares únicos da existência potenciam o risco de se falhar completamente o objetivo. Há muito mundo para além daquilo que a razão é capaz de assimilar e compreender. Também o valor da liberdade, que em si mesma não é boa, nem má, depende sempre da forma, mais ou menos sábia, de ser usada. Mas a sabedoria de escolher bem é um dom, a ela não se chega através de torres de livros, opiniões ou razões, por mais altas que sejam... tal como não é por muito abanar os braços que se levanta voo.
Os sentimentos articulam-se de forma não absolutamente lógica entre si e connosco. A vocação do homem apenas se cumpre quando ele se faz humilde, se esvazia das coisas e das suas opino-razões, para permitir que a vida, na sua generosidade, o edifique e lhe dê consistência, a partir da essência.
Acreditar é uma forma de unir o sentir ao pensar, talvez a ponte por onde estas duas dimensões se encontram e complementam. Só tem fé quem sabe e sente que não é ele próprio o centro do mundo.
A liberdade, tal como a justiça que a devia orientar, tem, por vezes, olhos vendados. O seu valor é pois relativo dado que um cego nem sempre é o melhor guia de outro... Não devemos fazer ou ser tudo quanto podemos, embora possamos fazer ou ser tudo quanto devemos. O dever demora até surgir evidente à razão, por vezes cumpre-nos agir numa linha de livre obediência a um desígnio maior que nós. Um tremendo caos, mas apenas aparente, pois que é de uma ordem superior à nossa capacidade de o compreender.
Somos todos pequenos e quase insignificantes. Aceitarmo-nos uns aos outros nessa condição é o primeiro passo para nos conhecermos e amarmos... para nos fazermos uns aos outros humanos, até felizes, por vezes. Verdadeiramente.
Hoje tende-se a aniquilar toda a crença. Como se não fosse admirável em si mesmo um homem esperar contra toda a razão. A fé é um alvo recorrente de gente que, não sendo feliz, tenta estragar a felicidade de todos quantos, com fé, sabem sem saber e sentem sem sentir.
O amor implica uma livre submissão do eu ao outro. Uma dinâmica sem garantia alguma de sucesso, mas que esvaziando o eu de si mesmo, e das coisas, abre espaço para a coragem da alegria, e, por ela, à felicidade.
No Natal devíamos todos celebrar a chegada do Filho de Deus, que por amor a nós se fez Homem, mas andamos cheios de nós mesmos e atafulhados de coisas... e é assim que, de portas fechadas, Ele nos encontra quando pretende dar-nos a Sua paz e a nossa felicidade... somos livres e responsáveis pela nossa vida; por abrir e fechar as portas do nosso ser ao que não compreendemos; por permitirmos que quem nos quer amar nos ame.
De nariz no ar, ignorando o mundo, podiam ao menos abrir os olhos e dar-se conta da estrela que conduz quem, humildemente, percebe que não é, por maior que seja, grande coisa sozinho.
Que neste Natal saibamos escolher o presente certo para dar a quem nos ama: esvaziarmo-nos de nós mesmos e abrir o coração ao seu amor.

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