Acabaram as férias

Vasco Pulido Valente
Público 12/01/2013

O relatório do FMI irritou as cabeças pensantes do país. Sobretudo as de esquerda, mas não só elas. Primeiro, como de costume, os "peritos" do PS inventaram uma conspiração devidamente inverificável e complicada para assustar os portugueses. O relatório é, no fundo, uma "fraude", congeminada em segredo pelo Governo e por meia dúzia de técnicos que a sra. Lagarde mandou para cá com o propósito maléfico de esconder a manobra. E é também o "verdadeiro" programa, que Passos Coelho não se atreve a mostrar em público e que já tinha sido anunciado pelo meu amigo Marques Mendes ("armado em chico-esperto") numa televisão qualquer. Com esta origem mais do que dúbia, o relatório não podia senão ser um manifesto de alguns monstros sem "sensibilidade", que pretendem "destruir" o Estado social.
Por hipótese de trabalho, admito que sim. Infelizmente, a impressão com que fiquei das 76 penosas páginas, que tanto impressionaram o indígena, foi a de ler um curto catálogo (nem sempre exacto) da extraordinária aberração em que, pouco a pouco, se tornou o Estado português. Muitos dos factos da laboriosa lista do relatório são conhecidos pela maioria da população e, com certeza, pela nuvem de economistas que pretendem salvar a pátria. Pior do que isso: o amador mais distraído não precisava de espremer o cérebro para duplicar ou triplicar o diagnóstico (de irresponsabilidade e loucura) a que o FMI chegou. Da administração central à escola e à saúde, a história não muda e, ainda por cima, nós sabemos quem nos levou a esta quase inconcertável balbúrdia.
Claro que seis técnicos do FMI, que, suponho, desembarcaram em Lisboa sem saber a língua, a História e as tradições de Portugal, não podiam recomendar soluções com senso para um país que se resumia, para eles, a umas folhas de papel. Falaram com ministros, com secretários de Estado, com uma pequena manada de ajudantes e por aí fora. Mas claramente não compreenderam o nosso mundo político ou a nossa sociedade. O grosso das propostas que apresentaram não é exequível, nem possível, no Portugal de 2013. O Governo e uns tantos deputados aprenderam com a fricção do dia-a-dia até onde o eleitorado lhes permitia ir e onde estava, e está, o terreno perigoso e proibido. E são eles que decidem, não são os mandaretes da sra. Lagarde. Acabaram as férias. Vamos ver agora se discutimos seriamente as coisas.

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