Ratzinger e a necessidade de religião

Henrique Raposo
Expresso, Quarta feira, 13 de fevereiro de 2013

Um dos pontos fundamentais dos textos seculares de Ratzinger tem sido a defesa do Direito Natural. Como é óbvio, a fé de Ratzinger alimenta um Direito Natural de estirpe católica. Mas, bem vistas as coisas, o Papa demissionário nem sequer precisaria de Deus para justificar a presença do Direito Natural na vida coletiva dos homens. Bastar-lhe-ia olhar para o primeiro tijolo do seu ADN político: o contacto com a Alemanha nazi. Nas primeiras páginas da autobiografia, A Minha Vida, podemos ver como o jovem Joseph Ratzinger viveu sob o jugo do nazismo, um regime que assentava a sua força na recusa do Direito Natural, na negação de qualquer critério ético acima do Poder. O fundamento da Alemanha nazi era a ideologia do Führer, um totem de bigodinho, um ídolo pagão. Daí o termo "totalitarismo pagão", muito usado por pensadores cristãos daquele tempo.   Por outras palavras, naquele sistema totalitário o Poder era sinónimo de Verdade - a antítese do Direito Natural . O jovem Ratzinger percebeu logo ali que o historicismo só podia (e só pode) acabar mal. Os critérios morais não podem ficar na mão exclusiva do homem. 
Para selarmos esta crítica ao historicismo que recusa qualquer ética transcendente, convém registar que uma kantiana como Susan Neiman acaba por dizer o mesmo que Ratzinger: "quanto mais responsabilidade pelo mal era deixada aos seres humanos, menos importância a espécie parecia dar-lhe" . Os totalitarismos do século XX nasceram desta total autonomia moral do homem em relação a qualquer moral transcendente. No fundo, a imanência é uma treta.

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