Habemus Papam Franciscum

João Carlos Espada Público, 18/03/2013
Segundo Weigel, existe uma forte continuidade entre João Paulo II, Bento XVI e Francisco

A mensagem Habemus Papam Franciscum chegou-me durante a viagem aos EUA que efectuei na semana passada. Teve a vantagem de me permitir observar em directo o impacto que a eleição do Papa produziu durante toda a semana num país que não é maioritariamente católico. E o impacto foi imenso, com os jornais e telejornais a abrirem diariamente sobre o tema.
É claro que um dos aspectos mais citados foi a origem não-europeia, particularmente sul-americana, do novo Papa - que reúne, alías, várias singularidades: é o primeiro Papa não-europeu, o primeiro jesuíta, e o primeiro Francisco. Os analistas não se cansaram de repetir estas características inéditas e de especular sobre o seu significado.
Particularmente interessante pareceu-me a análise de George Weigel, famoso biógrafo de João Paulo II e fellow do Ethics and Public Policy Center, em Washington, DC. Weigel saudou a eleição do novo Papa e recordou a longa entrevista que tivera com ele, então cardeal Bergoglio, em Buenos Aires, em Maio passado.
Nessa entrevista, o cardeal Bergoglio citara enfaticamente a declaração da 5.ª Conferência dos Bispos da América Latina e Caraíbas, em 2007, que ficou conhecida como Documento da Aparecida. Aí se defende a necessidade de uma renovação do catolicismo através de uma maior comunhão entre a estrutura da Igreja e os fiéis, bem como de uma mais autêntica vivência da fé cristã.
Curiosamente, George Weigel escolhera duas citações desse documento dos bispos latino-americanos para epígrafe do seu novo livro sobre o "Catolicismo Evangélico", recentemente editado e bastante discutido na imprensa de língua inglesa.
George Weigel considera esse posicionamento do então cardeal Bergoglio como uma clara manifestação de que o Papa Francisco I será uma Papa da Nova Evangelização defendida por Bento XVI. Segundo Weigel, existe uma forte continuidade entre João Paulo II, Bento XVI e Francisco.
A segunda característica de Francisco, ainda segundo George Weigel, é que será um Papa reformador. Não reformador no sentido em que muitos sectores anticatólicos provavelmente desejariam, mas no sentido de reformador da Cúria romana. Weigel considera Francisco I particularmente vocacionado para reformar a vida interna do Vaticano devido à sua longa experiência pastoral em Buenos Aires.
Os primeiros sinais do novo Papa parecem realmente confirmar a análise de Weigel. Os jornais americanos não se cansaram de repetir que o Papa fora pessoalmente pagar as despesas da sua estadia durante o conclave, e que o fizera no transporte normal dos cardeais, não numa viatura papal. A humildade e a simplicidade seriam mensagens marcantes, intencionalmente marcantes, do novo Papa.
Em terceiro lugar, Weigel sublinha que o Papa Francisco será um continuador da defesa da democracia e dos direitos humanos assumida por João Paulo II e Bento XVI. Na sua Argentina natal, o cardeal Bergoglio enfrentou o populismo da Presidente Cristina Kirchner, criticando simultaneamente as suas medidas centralizadoras e a sua legislação "fracturante" (designadamente o casamento homossexual, aprovado em 2010).
Este comprometimento com a democracia e os direitos humanos será particularmente importante em África e na China, argumenta Weigel. É aí que a Igreja de Roma regista crescimento mais rápido e é aí que a defesa dos direitos humanos ganha particular centralidade.
O novo Papa dará certamente a esta defesa da democracia e dos direitos humanos uma profunda dimensão social, que sempre caracterizou a sua acção pastoral na Argentina. Mas essa dimensão social, claramente presente em toda a doutrina social da igreja, não será certamente confundida com as inclinações colectivistas da chamada "teologia da libertação". O cardeal Bergoglio foi sempre um crítico dessas tendências na América Latina, onde a teologia da libertação foi muito influente - a ponto de ter levado a uma clara condenação por parte de João Paulo II.
Apesar de ser visto como continuador de João Paulo II e Bento XVI, a verdade é que Francisco foi bem recebido por todos os sectores, incluindo os que expressaram reservas, ou mesmo críticas, aos seus antecessores. Esse espírito de unidade da Igreja, que tende a ocorrer aquando da eleição de um novo Papa, será certamente importante para a acção reformadora de Francisco.

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