Tivemos um Grande Papa Teólogo

P. Duarte da Cunha
Voz da Verdade, 2013.03.10

Certamente, nos próximos tempos poderemos aprofundar e mastigar melhor todo o ensinamento de Bento XVI. Mas podemos dizer desde já que sabemos que tivemos, sem dúvida, um Papa teólogo que nos deixou um enorme legado. Quase à maneira dos antigos Padres da Igreja, todo o seu pensar e toda a sua pregação falam de Deus aos homens e tem como objectivo que cada um se encontre com Deus.

Gostaria de, muito brevemente, sublinhar alguns pontos do que julgo ser a síntese teológica presente na sua pregação e nos seus documentos enquanto Papa, onde também se percebe a sua avaliação sobre o que é urgente e o que é essencial nos nossos tempos e na nossa Igreja.
1. A centralidade de Deus. Poucos meses depois de ter sido eleito Papa, Bento XVI foi às jornadas Mundiais da Juventude em Colónia. O centro de toda a sua mensagem, quer no que disse quer no estilo que quis imprimir no encontro, foi a adoração. E esta foi uma constante no seu pontificado. Adorar a Deus, reconhecendo que Deus é Deus foi um apelo constante. É muito interessante que o Papa tenha frequentemente sublinhado o facto de o primeiro documento aprovado no Concílio Vaticano II ter sido a Constituição sobre a liturgia, dizendo que isso fez com que Deus tivesse a prioridade e o primado em tudo no Concílio. A importância de Deus não é uma coisa teórica ou ideológica que a Igreja deve repetir, mas um elemento essencial da pessoa humana. Bento XVI insistia na importância de Deus na vida porque, como disse na Encíclica Caritas in Veritate, "sem Deus, o homem não sabe para onde ir e não consegue sequer compreender quem é."
2. A centralidade de Deus, porém, não é a de um Deus em abstracto, mas do Deus de Jesus Cristo. Marca fundamental desta sua certeza de fé é o testemunho que o Papa emérito sempre deu do seu amor a Jesus e da sua certeza de que Ele nos revela e comunica Deus. Os seus livros sobre Jesus são a prova evidente de que em tudo e sempre Bento XVI nos quis falar de Jesus. Em Jesus não via, porém, apenas alguém do passado ou um ser espiritual invisível. A historicidade de Jesus de Nazaré e o enfâse que dava ao "rosto humano de Deus" revelado em Jesus foram constantes do seu pontificado. A começar pela sua viagem a Manopello onde está a mais antiga representação do rosto de Jesus, e sempre que pôde ele falou do "rosto de Deus". Podermos percorrer tantas homilias e catequeses e é quase certo que encontraremos uma referencia a este rosto, a esta pessoa concreta que é Jesus. É aqui que podemos também aperceber-nos da convicção que o Papa tem da ressurreição de Jesus. Ele ressuscitou mesmo. Não é só uma ideia dos apóstolos, ou uma energia que estes sentiram, mas o rosto do ressuscitado pode ser sempre encontrado e com ele há uma nova etapa na história.
3. Para ser encontrado, Jesus deixou-nos a Igreja. "Através da Igreja, o Mistério da Encarnação permanece para sempre presente. Cristo continua a caminhar através dos tempos e em todos os lugares." Nunca houve dúvidas de que o Papa sabia bem que a  Igreja, como ele voltou a sublinhar no seu último discurso aos cardeais, é o corpo de Cristo e não apenas como uma organização feita pelos homens. É por isso que ela é tão amada por ele. O Papa, nesse mesmo discurso, voltou a dizer que a Igreja no seu mistério constitui "para nós a razão e a paixão da vida". Numa altura em que para o mundo a Igreja é cada vez mais apenas vista como uma entre muitas organizações humanas, o Papa testemunha a sua certeza de que esta realidade humana é mais do que uma coisa de homens. "a Igreja é um corpo vivo, animado pelo Espírito Santo e vive realmente pela força de Deus. Ela está no mundo, mas não é do mundo: é de Deus, de Cristo, do Espírito."
4. Em tudo isto percebemos que o Papa teólogo não foi apenas alguém que tinha estudado muita teologia, mas alguém que percebia tudo a partir da fé. O seu olhar para o mundo é um olhar teológico que consegue ver tudo a partir de Deus e percebe que tudo está orientado para Deus. O maior inimigo deste Papa é, por isso, o pecado que leva os homens a quererem viver sem Deus ou mesmo contra Deus. O combate ao pecado para salvar o pecador foi permanente ao longo destes oito anos.
5. O facto de ter convocado um ano da fé não foi por acaso. Como Bento XVI disse em Outubro, "proclamei este ano especial precisamente para que a Igreja renove o entusiasmo de crer em Jesus Cristo!" Levar todos os crentes a renovarem a sua fé para poderem experimentar a alegria do encontro com Deus em Jesus Cristo e anunciar a fé aos que ainda não conhecem Jesus é a grande missão que temos pela frente. Mas o Papa também quis, desde o início do seu pontificado, que percebêssemos que há uma unidade na missão da Igreja. A evangelização que leva ao anúncio da fé, a liturgia que mostra o primado da adoração, o testemunho da certeza da esperança em Deus, estão sempre e necessariamente associadas à prioridade da caridade na missão. Caridade, liturgia e Evangelização não são aspectos separáveis na vida da Igreja, mas dimensões da mesma e única missão da Igreja que consiste em levar Deus ao homens.

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