A caminho do Estado "social"

ALBERTO GONÇALVES
DN 2013-04-14

Antigamente, ou seja até há meia dúzia de dias, inúmeros portugueses criticavam o Governo por apostar na receita e ignorar a despesa. Eu estava com eles. Desde que Vítor Gaspar decidiu compensar os votos do Tribunal Constitucional (TC) mediante a suspensão de determinados gastos públicos, muitos dos portugueses referidos saltitam furiosos, a acusar o Governo de "chantagem" e "vingança". Não estou com eles.
Se não for pedir demasiado, convém que as pessoas decidam se preferem corrigir as contas públicas pelo lado do emagrecimento da coisa pública ou pelo lado do emagrecimento dos contribuintes (também existe aquela ala folclórica que prefere não corrigir contas nenhumas, mas aqui falo de gente crescida). O que não se pode é defender apenas o fisco que estrangula os outros ou a poupança que não nos afecta. Condenar o aumento de impostos e, em simultâneo, atacar o seu reverso é, sem ofensa, uma palermice.
Ainda por cima quando o reverso é tão vago. Bem sei que os "telejornais" gostam de começar em tom dramático. Porém, o "congelamento" dos gastos é limitado no alcance e provisório na duração. Além disso, nem sequer é inédito, visto que em Setembro passado aconteceu decisão similar e, talvez porque então o PS ainda não revelava desesperada urgência em chegar ao poder, sem uma fracção do drama actual. Histeria à parte, conforme aliás explicou Guilherme d'Oliveira Martins, um reduto de sensatez em pleno manicómio, trata-se apenas de um remendo destinado a ganhar tempo enquanto não se encontra uma alternativa aos mil e trezentos milhões com que o TC embirrou. É uma necessidade, não uma convicção.
Antes fosse uma convicção, visto que um Governo austero com o dinheiro alheio é melhor do que um Governo magnânimo. Infelizmente, o estranho "liberalismo" do primeiro-ministro e do ministro das Finanças é na essência pouquíssimo liberal. Sempre que não se entretêm a saquear os cidadãos, os esforços deles dedicam-se a evitar reformas e a adiar os "cortes" de 4 mil milhões, agora elevados a 5 mil e 300 milhões ou, há quem garanta, a 7 mil milhões. Caso alguma vez procedam de facto ao "corte" estrutural de uns cêntimos será sob ameaça da troika, a qual, se continuarmos a brincar às nações independentes, seca definitivamente a fonte e transforma-nos enfim no Estado "social" com que tanto sonhamos. "Social" no sentido de miserável, claro.

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