No Egito só uma certeza: quem se lixa é o cristão

LEONÍDIO PAULO FERREIRADN 2013-08-19

Igrejas queimadas, lojas atacadas, casas cercadas por multidões, uma menina morta a tiro no Cairo quando ia para a catequese. A vida nestes dias é de terror para os coptas, a comunidade cristã árabe a que pertence um em cada dez egípcios.
Acusados de apoiar a repressão militar contra os Irmãos Muçulmanos, os coptas têm sido alvo da vingança dos partidários do ex-presidente Morsi, derrubado em julho. Uma ira cheia de fanatismo religioso que se acentuou na semana passada, quando os generais mandaram dispersar os manifestantes que exigiam a libertação de Morsi, causando mais de 600 mortes.
A liderança dos Irmãos Muçulmanos condena as agressões, mas a rapidez dos ataques às igrejas desde Alexandria a Assuão deixa no ar suspeitas de ação coordenada. E abundam os apelos à retaliação contra os coptas, que apesar de serem oito milhões se sentem abandonados.
É certo que o papa Tawadros III surgiu ao lado do general Sissi a apoiar o derrube de Morsi, o primeiro presidente eleito da história do Egito. Mas também o imã da Universidade de Al--Azhar pôs o seu selo nesse golpe que visou travar a apropriação total do mais populoso dos países árabes pela poderosa confraria fundada há um século.
Não é de hoje a perseguição aos coptas. Nem mesmo a proteção da ditadura militar evitou que no Ano Novo de 2011 um atentado tenha feito dezenas de mortos numa igreja de Alexandria. Faltavam poucas semanas para Mubarak ceder à Primavera Árabe. Já depois disso, os mesmos militares que são agora acusados de apoiar dispersaram a tiro um protesto contra a demolição de uma igreja em Maspero, matando mais de 20 coptas.
Não se percebe para onde vai o Egito. Há quem saúde na rua os soldados por terem metido os islamitas na ordem, há quem considere - como o Nobel Baradei - que os generais passaram a linha vermelha e há quem prometa cobrar todo o sangue derramado. De fora, os sauditas aplaudem Sissi, os turcos condenam o massacre, americanos e europeus não sabem como reagir depois de terem evitado chamar golpe ao golpe de julho.
Mas é certo o destino dos coptas, cuja liturgia inclui palavras que vêm dos tempos dos faraós e que foram cristianizados por São Marcos, 600 anos antes da vinda do islão. Vão continuar a emigrar em massa. E cada vez menos darão figuras de topo ao Egito, como um tal de Butros Ghali.
É a repetição do êxodo dos cristãos iraquianos, hoje meros 500 mil. O pós--Saddam tem sido violento, com massacres até em missas, como o de 2010 na Igreja de Nossa Senhora do Socorro, "Sayiada an Nayá" em árabe. E imita-se também a fuga que já começou dos cristãos sírios, presos entre apoiar um cruel Bashar que os protege e uma rebelião onde a Al-Qaeda brilha.
Em tempos, foi o cristão sírio Michael Aflak a idealizar o panarabismo. Essa unidade, sem fronteiras ou religiões, nunca passou de quimera. E um destes dias, o que unirá o mundo árabe será o vazio de cristãos.

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