Chamem a mãe do Varoufakis

Inês Teotónio Pereira
ionline, 20150620

Desde que o Syriza ganhou as eleições que passamos os dias a ouvir queixinhas. Andamos nisto há meses e já não dá para nos fingirmos de mortos como eu faço com os meus filhos.
Os meus filhos discutem muito: “Tira o pé!”, “Não tiro. Eu tinha aqui o pé primeiro que tu!”, “Se não tira o pé levas…”, “Dá lá…”. Acaba quase sempre tudo à estalada e com alguns a chorar. Nos dias que correm, e tendo em conta o desgaste do meu mandato como mãe, só lhes peço que chorem baixinho e que não partam nada. Exijo pouco. Às vezes eles tentam relatar-me ao pormenor as batalhas que travam para que eu faça justiça pelas minhas próprias mãos. Recuso-me a ouvir. Não quero mesmo saber. Desde que não partam nada e que eu consiga manter a concentração naquilo que estou a fazer, até podem rebolar pelo chão e arrancar cabelos uns aos outros que de mim só levam silêncio. Só quando chego ao limite é que vão todos de castigo.
Vem isto a propósito da Grécia. Desde que o Syriza ganhou as eleições que passamos os dias a ouvir queixinhas. Os responsáveis gregos lutam energicamente com os responsáveis europeus dentro das salas de reuniões e no fim vêm todos cá para fora fazer queixinhas: “Olhem eles, que não nos emprestam mais dinheiro”, queixa-se o ministro grego da mota. “Nós não emprestamos mais dinheiro porque eles não se portam bem“, defendem os alemães, franceses, espanhóis, holandeses, etc. “Mas nós prometemos que nos vamos portar bem”, garantem os gregos. “Então cortem lá nas pensões… “, desafia o senhor holandês. “Não!”, insiste Varoufakis . “Estão a ver, por isso é que não emprestamos: quem nos garante que eles se vão portar bem?”, rematam os representantes dos contribuintes europeus. 
Andamos nisto há meses e a verdade é que já não dá para nos fingirmos de mortos como eu faço com os meus filhos. Ora, para bem da sanidade mental de vários povos europeus e de milhões de famílias é preciso acabar com isto. Ao princípio foi giro, todos achámos graça conhecer um ministro do tipo Louçã em versão de capa de Maxmen a andar de mota com os colarinhos para cima e a passear pelos corredores sombrios das instituições europeias, mas já chega. Não,  já não queremos saber quantos jardineiros tem a Grécia, não queremos decorar mais nomes gregos e não achamos bem que sejam os gregos a abrir os telejornais e não as novas contratações da primeira liga. Temos saudades da época em que da Grécia moderna só sabíamos da existência de iogurtes e de ilhas paradisíacas. Era tudo mais simples. 
Dizia a senhora Lagarde que é preciso um adulto na sala para discutir com os gregos. Pois bem, voluntario-me, aceito o desafio. Se é um adulto que todos desejam para acabar com esta discussão, eu posso ser esse adulto: tenho vasta experiência que adquiri com os meus filhos e já há muitos anos que não entro no grupo dos elegíveis como jovem agricultora, por exemplo. 
Proponho, portanto, o seguinte: irei moderar já a próxima reunião de segunda-feira na qual exigirei que todos se portem como meninos crescidos. Primeira exigência: fala um de cada vez e todos têm de apresentar garantias em vez de promessas. Os meus filhos também prometem imensas coisas quando eu os ponho de castigo e já lá vai o tempo em que acreditei em todas elas. É, por isso, seguro que já não vou na cantiga das promessas - neste capítulo o meu currículo é sólido. Segunda exigência: ninguém faz queixinhas no final das reuniões e só eu é que posso falar com terceiros.
Os meus filhos também fazem muitas queixinhas e se eu desse ouvidos a todas elas ainda hoje estava a moderar uma discussão de Agosto de 2013. Queixinhas, portanto, não valem e muito menos a terceiros. Terceira exigência: ninguém se senta no chão, as motas ficam em casa e todos se apresentam nas reuniões de farda formal para não haver distrações. Asseguro desta forma que Bruxelas não é o recreio da escola, tal como asseguro diariamente que a sala de minha casa não é um quarto de brincar. Assim, é mais provável que se chegue a acordo. Com os meus filhos, pelo menos, resulta e ainda nenhum fugiu de casa. 
Aceitem este meu desafio e em três dias voltamos à normalidade dos bons velhos tempos em que sabíamos mais sobre a Grécia Antiga do que sobre os dramas das contas públicas da moderna.  

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