O futuro do passado

Viriato Soromenho Marques, DN 2015.10.22
Em 22 de outubro de 1985, Portugal estava também a digerir os resultados de umas eleições em que se havia registado uma esmagadora maioria de esquerda (39,7% para PSD e CDS, contra mais de 55% do PS, PRD, APU e UDP...).
Contudo, apesar de Gorbachev estar na altura a ensaiar as suas reformas na URSS, o Muro de Berlim permanecia firme. Por isso, a nova estrela do PSD, Cavaco Silva, formaria governo, apesar de ter obtido uns escassos 29,8% dos sufrágios. Portugal acabava de sair da segunda intervenção externa do FMI, enfrentada por um amplo governo de bloco central liderado por Mário Soares, que se dissolveria após a missão cumprida. Comparativamente com o rendimento dos europeus residentes nos países da Comunidade Europeia, os portugueses eram pobres (cerca de 60% da média da CE). Contudo, em 1985, existia uma atmosfera de otimismo e esperança, que parecia bem assente na realidade objetiva. A adesão à Comunidade Europeia, que iria entrar em vigor no dealbar de 1986, marcava o fim de uma década de deriva hesitante após o colapso do império colonial. Embora sem atingir os níveis de maior crescimento económico (a média de 6,5% atingida entre 1960 e 1973), a verdade é que a integração europeia significou até ao início do século XXI uma convergência real portuguesa com o resto da União (o pico foram os 72,6% da média europeia atingidos pouco antes da crise mundial de 2008). O tempo linear, todavia, não coincide com o tempo histórico, que obedece a ciclos sinuosos, como nos ensinou, já em 1725, o grande G. Vico. Desde 2008, Portugal recuou no PIB, no rendimento das famílias, no investimento, na confiança em si próprio. A Europa transformou-se de um porto seguro num encapelado oceano onde só sobrevivem marinheiros experimentados. Esperemos que o devir não nos reserve um sombrio regresso ao passado.

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