Os “tempos normais” de Sócrates

Eduardo Cintra Torres
Correio da manhã 08.05.2016 00:30 

Lá foi Sócrates fazer o seu número ao Marão, ofuscar o próprio Costa, para aparecer. 

Estar vivo é não estar morto, disse uma vez, e com razão, Lili Caneças. Para quem faz da presença nos media um salva-vidas, aparecer é mesmo estar vivo e não morto no espaço público. Costumo citar um ministro francês de há cerca de 170 anos, que dizia a um amigo: "Aparecer! É preciso aparecer!" Tinha a obsessão de aparecer nos jornais, o único media de massas da altura. Nós, para cá ou para lá do Marão, temos o ex-primeiro-ministro e prisioneiro de Évora com a mesma preocupação de aparecer. Para ele, estar vivo é aparecer na TV e restantes media. Embora, por esta altura, já não recupere nem estatuto nem popularidade, que lhe foram fundamentais para se manter no poder, ao aparecer pretende transmitir a sensação de que não é culpado de nada e pode, como diz a metáfora, "dar a cara". A metáfora corresponde aqui à realidade: mostra a cara e, de caminho, desafia a comunidade política e principalmente a justiça, que não pode responder, por prática institucional. Desta vez foi António Costa, primeiro-ministro, a dar-lhe a oportunidade de aparecer no Marão. Não se tratou de insensatez, pois Costa sabia bem o que fazia. Quis mostrar a sua filiação política e a sua dívida política para com Sócrates; quis juntar-se a Sócrates na pressão sobre a justiça, um acto de insolência próprio da sua arrogância napoleónica; e quis calar as críticas do próprio Sócrates, que há pouco tempo – na sua aparição mediática anterior – criticou Costa dizendo que, se fosse ele, não formaria um governo sem maioria absoluta. Para dez milhões de portugueses, essa crítica, ou qualquer outra que Sócrates faça, não tem hoje qualquer valor político, mas Costa junta à arrogância uma característica muito comum em alguns políticos, apresentadores de TV e actores: como vivem, por opção, do que julgam ser a opinião pública dominante a cada momento, são extremamente sensíveis a tudo o que se diz e escreve. A arrogância e a insegurança são-lhes gémeas. É por essa razão que o PS de Sócrates e Costa, obcecado com a opinião pública e a opinião publicada, tem a tendência para a intolerância, a pressão sobre jornalistas, a censura e o desejo activo de controlar os media, como se viu esta semana por causa de uma notícia apresentada por José Rodrigues dos Santos. Lá foi Sócrates fazer o seu número ao Marão, ofuscar o próprio Costa, para aparecer, como o ministro francês. Para ele, isto é que são os "tempos normais", os tempos em que é protagonista deste horrível reality show do PS e debita as notas que decorou antes de chegar ao local. Resta-me dizer que o ministro francês não chegou a estar um ano no governo.
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A ver vamos: 
Intolerância - Novo ataque a Rodrigues dos Santos 
Uma vez mais, o PS exibiu a sua intolerância democrática. Três dos seus deputados, entre os mais trauliteiros, atacaram com ferocidade José Rodrigues dos Santos por causa de uma notícia sobre a dívida pública no Telejornal. Não justificaram os ataques. Apenas insultaram o jornalista, poupando a RTP e o Telejornal. Era mesmo ele que queriam condicionar e levar ao seu saneamento. A caixa de correio de um dos trauliteiros encheu-se de vómitos de gente de "esquerda" exigindo censura, saneamento e uma RTP totalmente ao serviço do governo. A notícia era factual. Errou na representação gráfica da evolução da dívida, com um intervalo temporal deformado, mas que não alterava a essência da informação. O PS não gostou de uma notícia que transmitia factos e que nem sequer mencionava os governos que mais aumentaram a dívida, só os anos em que ela mais se agravou. Prefere a ocultação e a mentira. O PS de 1975, da luta pela liberdade, é apenas memória. 
Já agora: Não posso dizer o nome que se dá a isto 
O presidente da EDP foi a Londres apresentá-la aos mercados. Não foi sozinho. Ofereceu viagens a jornalistas, nomeadamente dos canais generalistas. Os jornalistas fizeram notícias simpáticas e entrevistaram o presidente da EDP. Não informaram que a empresa pagou viagem e estadia. Qualquer um fazê-lo é péssimo; a RTP fazê-lo é mau demais.

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