Precisamos de “cantinhos de conforto” nos hospitais e de pediatras nos centros de saúde

São pelo menos seis mil as crianças e jovens que todos os anos precisam de cuidados paliativos no país.

Se no cancro já há equipas organizadas, noutras doenças não há quase nada

Por ano, há pelo menos seis mil crianças e jovens (até aos 18 anos) a precisar de cuidados paliativos e uma pequena minoria, cerca de duas centenas por ano, irá morrer, sobretudo de cancro, doenças cardiovasculares e neuromusculares. Para a pediatra e oncologista do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa Ana Lacerda, que analisou os dados e fez estas contas, o Kastelo é uma iniciativa “excelente”, mas é essencial pensar num plano a nível nacional. Também Manuel Capelas, da Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos, frisa que se está a partir quase do zero nos cuidados continuados e paliativos pediátricos em Portugal e que é preciso “planeamento estratégico”.

Desde 2005, com uma equipa que presta este tipo de apoio a crianças com cancro no IPO de Lisboa, onde trabalha, Ana Lacerda coordenou um grupo de trabalho para criação de uma rede nacional de cuidados continuados pediátricos e elaborou uma proposta que está nas mãos dos responsáveis do Ministério da Saúde.


Ministério quer cuidados paliativos de “qualidade” ainda neste semestre
Propõe-se, entre outras coisas, a criação de equipas intra-hospitalares e de núcleos de cuidados pediátricos em cada um dos agrupamentos de centros de saúde (Aces), recuperando a figura do pediatra comunitário. “As famílias das crianças querem tê-las em casa, mas para isso precisam de suporte”, frisa a médica.

Quando isso não é possível, a alternativa poderá passar pela criação dos chamados “cantinhos de conforto” nos hospitais, aproveitando quartos dentro dos serviços de pediatria, mas organizados em moldes diferentes, sugere. Quartos onde os pais possam ficar à noite, onde haja visitas à vontade, onde “as crianças não tenham a tensão arterial medida três vezes por dia”, exemplifica.

Se, no cancro, já há equipas organizadas, como nos IPO de Lisboa e do Porto, nas doenças neurológicas, nas metabólicas, nas neuromusculares — patologias com que estes doentes podem viver ao longo de décadas — não há quase nada, lamenta.

Estas crianças e jovens estão dispersas pelos serviços de saúde, quando deveriam ser apoiadas por equipas especializadas, recebem cuidados mas não de forma organizada. Como é difícil ter serviços especializados para todos, devia haver pelo menos um quarto especial nos serviços de adultos, recomenda.

Sublinhando que o que está aqui em causa não são apenas cuidados em fim de vida (os paliativos vão muito para além disso), Ana Lacerda acredita que a criação de unidades como o Kastelo é importante mas deveria ser o último passo, até porque estas estruturas são muito difíceis de sustentar do ponto de vista financeiro e são “pouco equitativas”. Porquê? “Porque para se poder assegurar este tipo de cuidados perto de casa teríamos que ter uma em cada distrito”, lembra. Serão precisas alternativas pontuais ao internamento, como é o caso do Kastelo, mas o grande foco serão sempre as famílias, que deverão ser ajudadas e ensinadas a cuidar destas crianças onde elas devem estar, em suas casas, insiste.

Manuel Capelas lembra ainda o trabalho desenvolvido por instituições, como a Fundação do Gil e a Acreditar (crianças com cancro), que têm prestado apoio aos hospitais com equipas de apoio domiciliário. 

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