A Bolha do Natal


INÊS TEOTÓNIO PEREIRA             DN             23.12.2017


Chega o Natal e chega a altura de idolatrar as criancinhas. Eu, inclusive. É uma estupidez sem limites. Ando há semanas a comprar presentes para o meu filho mais novo, não comprei um presente e pronto, comprei uma série de porcarias e sorri quando paguei cada uma delas só de imaginar o sorriso e a felicidade da criança ao abrir os embrulhos. Os meus outros filhos olham para mim com alguma comiseração e abanam a cabeça cada vez que apareço com mais um dos membros da Guarda do Leão ou mais um cão da Patrulha Pata. Mas é assim, hoje em dia o Natal serve quase exclusivamente para acabar de estragar as criancinhas que ainda não estragadas. 


Torná-las verdadeiramente insuportáveis e mimadas, caprichosas e irritantes. É o que se espera de alguém que começa uma carta com "quero" - nem a Autoridade Tributária se atreve a tanto. Mas as criancinhas podem. E no Natal podem tudo. A verdade é que alguém, algures e há não sei quanto tempo fez crer ao mundo que o Natal é das crianças. Com que fundamento meu Deus? Jesus nasceu para todos e não apenas para quem não sabe apertar o cinto de segurança e é viciado no canal Panda. Não faz sentido. E não é das crianças desfavorecidas, pobres, órfãs e que precisam de ajuda e caridade. Não, é das crianças que começam cartas com "quero". E nós, obedecemos. Ou seja, alguém inventou que o Natal é das crianças e mandou a conta para os pais. E nós pagamos a sorrir.

Nas lojas encontro imensas mãe e pais como eu. Pessoas adultas, com alguma formação, com mais de dois dedos de testa, que pagam impostos e que sabem o valor do dinheiro, a queimarem notas em troca de carros que não vão durar dois dias, peluches que daqui a três meses estão na quermesse, construções que se vão destruir antes do ano novo e super-heróis que irão viver o resto das suas vidas debaixo do banco do nosso carro. Nós sabemos que é assim, mas teimamos em repetir o número trágico ano após ano. É mais ou menos como votar em socialistas: toda a gente sabe que é um disparate monumental, que os socialistas são irresponsáveis, que gastam o nosso dinheiro todo e que partem tudo assim como os nossos filhos arrancam o braço do homem-aranha ainda o galo não cantou, mas há quem vote neles. Há espera de uma espécie de milagre natalício, creio. Não se percebe. Mas o actual espírito de Natal é o mesmo: é o logo se vê, que agora quero estoirar o cartão de crédito no Faísca e nas bonecas Lol que os miúdos pediram (exigiram). Tenho sempre a impressão que quem nos vende o quartel de plástico da Patrulha Pata por 60 euros ou em Playmobil de 200 euros deve ir para casa agarrada à barriga a rir pela nossa parvoíce. Devíamos ser todos internados é o que era.

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